Fortaleza, 31 de agosto de 2019

Amo este livro! De uma delicadeza sublime.

Ele torna mais leve a alma da criança que o lê, do adolescente, do adulto que guarda em si a juventude e a infância. Plumas ao vento. Aqui, Isabella Lotufo nos leva por uma viagem feita de surpresas, sentimentos, poesia. Vamos guiados por Meteóris, uma menina corajosa, observadora, cheia de curiosidade, inquieta, mas doce e um pouco distraída. Seu nome significa “estrela cadente”, ou “estrela com cabelos.”

A viagem começa com um mapa.

E esse mapa faz promessas encantadoras de aventuras em um novo território. Nessa esfera um imenso continente das Artes é unido a um enorme continente da Natureza. Há o arquipélago da Paz, que fica no Mar Moroso. O continente do Invisível, no Mar Algoz. O continente da Astromagia, no Mar Atormentado. E, por perto, as ilhas dos Não-Nascidos. Há Desmemória, Atemporal, Temporal. Obviamente, a linha que separa os hemisférios se chama Linha de Tonto. São alegorias profundas que criam um mundo simples, com lógica, realidade e disciplina. Formam Domus, que é ao mesmo tempo um planeta imaginário e uma cartografia da alma de Isabella. É para Domus que somos levados.

Estamos, então, em outro tempo.

Novos lugares de fantasia, mas quase tudo é feito de nomes e coisas que conhecemos – tapete roxo, sonho, flor, escorpião, piano, montanha, goiaba, ovos de pássaros – e assim não nos sentimos perdidos nessa odisseia atual. Mas, também, aparecem elementos desconhecidos, ou que conhecemos apenas levemente, ou que nos fazem recordar ficções do futuro: audiobússola, pessoa que aparece em holograma, microsseringa, filtros, metamorfoses, telepatia, contatos extradômicos.

É uma viagem por um mundo de fantasia.

Com a plenitude da imaginação. E a imaginação é mais importante que o conhecimento, dizia Einstein, o físico genial que descobriu a relatividade do mundo ao olhar pela janela do ônibus em movimento e ver o movimento de um relógio na torre da cidade, a marcar o tempo. E com aqueles dados ele imaginou, e mudou o mundo.

Devemos exercitar a imaginação.

Precisamos dela. A imaginação vai além do saber e da cultura. Ela amplia a nossa mente. As decisões da vida são baseadas em um imaginário, já que é impossível saber o futuro. E as escolhas fundadas no imaginário tornam mais intensa a procura da felicidade e dos bons resultados. As mentes que mais exercitam a imaginação são possantes e valiosas. E nesta aventura da menina Meteóris cada leitor vai exercitar a sua imaginação, seja uma criança, um jovem ou um adulto.

Viajar é maravilhoso, sem sair do lugar.

E aqui vamos para recantos possíveis e impossíveis, passeamos por diferentes camadas da realidade, por mundos invisíveis, translúcidos, quando temos asas como num primeiro voo, quando os nossos pés andam numa travessia, sem que saibamos para onde vão. Um novo horizonte. Brincamos aqui com os contos de fadas, flores de adivinhação, jogos de metamorfoses e libertação, porque, como na nossa vida real, em Domus tudo se transforma.

Mas em Domus sabemos em que nos transformamos.

Em Domus conhecemos o mistério de nossa face interior. Mãe é transformada em árvore, Nastar em cavalo, Adamanto em lobo... Os elementos são constelações de significados atados por fios invisíveis, mas pressentidos, tirados parece que de uma fonte límpida, de filtros misteriosos, memórias perdidas. Palavras do nosso dia a dia são aqui recordadas como sons muito antigos.

As palavras, as frases neste livro são cristalinas.

E a linguagem tem a beleza da usina de fadas. Parece que flutuamos num mar de expressões recolhidas em um jardim repleto de flores mágicas. A busca da agnus-casta. É pelo encantamento de sua fala que Meteóris nos atrai, e não abandonamos a leitura, não esquecemos os personagens. Pelo encantamento da imaginação de Isabella.

Os personagens são feitos de mitos e de verdades.

São acessíveis, adoráveis, mesmo os malvados. O mal é inofensivo, o bem é preservado sob uma aura cintilante. Alguns personagens são simples crianças de nosso cotidiano, como Meteóris e Mércule. Outros são feitos de fantasia, às vezes de inspiração nos mitos, como as selkies, seres que vivem sete anos na terra e sete nas águas do mar, em forma de focas. Dragões alegres cantam, relampejam no céu, sem asas. Grifos, basiliscos, Cetus. Há ecos de mitologia grega, romana, indígena, de bestiários europeus, das lendas clássicas. Mas há aqui uma mitologia de Isabella, fundada em um sistema de cores e mutações. Todos os personagens têm sua alma-cromo. E têm um coração que brilha em cores significando sentimentos. Em Domus podemos saber os verdadeiros sentimentos pela cor do coração, e podemos saber a verdade e a mentira pelo colar que muda de cor: vermelho quando a pessoa diz a verdade, branco quando diz uma mentira, ou algo que não está de acordo com a realidade. Ou seria o contrário?

Que desenhos extraordinariamente simples e bonitos!

Os desenhos feitos por Meteóris, na verdade por Isabella, criam uma nova dimensão da viagem. Uma tocante trama sensorial se dirige diretamente ao coraçãozinho das crianças, à pureza das crianças, tal a candura das linhas e das imagens. Livro muito bom para sonharmos. E Isabella dá bons conselhos: “Escreva. Escreva. Escreva. Tudo”. E leia. “Ler é o único jeito de não enlouquecer quando se atravessa os bosques.”

Cintos afivelados, vamos lá!



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